sábado, 7 de abril de 2012
ADRIENNE RICH - POETA, ENSAISTA E FEMINISTA
A poeta e ensaísta Adrienne Rich, ícone da literatura feminista, morreu aos 82 anos na terça-feira, 27 de março, em sua casa em Santa Cruz, na Califórnia. De acordo com a família, a autora não resistiu a complicações de uma artrite reumatoide, doença que a acometia há anos.
O jornal New York Times cita que ela vendeu algo em torno de 800 mil exemplares de seus diversos livros de poesia, segundo a W. W. Norton & Company, sua editora desde a década de 1960. "Triplamente marginalizada — como mulher, lésbica e judia —, Rich preocupava-se em tratar, em sua poesia, e em muitos de seus ensaios, de questões de identidade muito antes de o termo ser criado", diz o texto.
Celebrada tanto por suas reflexões sobre sua vida quanto por comentários sociais mordazes, Rich recebeu diversos prêmios, incluindo o Ruth Lilly Poetry Prize e National Book Award, pela obra que abrange sete décadas --e uma das mais reunidas em coleção do século 20. A poeta, que era homossexual assumida e viveu uma era em que a homossexualidade era amplamente condenada na sociedade norte-americana, tornou-se pioneira na luta pelos direitos das mulheres e de outras minorias
"Ela realizou em verso o que Betty Friedan, autora de 'A Mística Feminina', fez na prosa", escreveu Margalit Fox sobre o bardo da pioneira feminista no obituário do The New York Times. O site da Poetry Foundation chamou-a de "uma das principais intelectuais públicas dos EUA".
Adrienne Rich nasceu em Baltimore, em 1929, fruto do relacionamento de uma pianista e de um renomado patologista e professor da John Hopkins. Ela se formou na Radcliff University e se casou com um professor de economia de Harvard, Alfred Conrad, em 1953, com quem teve três filhos. Seu marido morreu em 1970 e seis anos mais tarde ela foi morar junto com sua parceira Michelle Cliff.
Fonte: Folha de São Paulo
O DESERTO COMO JARDIM DO PARAÍSO
Que significaria pensar
que se é parte de uma geração
que tem simplesmente de passar?
Que significaria viver
no deserto, procurar viver
uma vida humana, algo
a transmitir aos filhos
para levar até à terra?
Que significaria pensar
que se nasceu acorrentado e que só o tempo,
nada do que se possa fazer
poder remir a escravidão
em que nasceu?
TEMPO NORTE-AMERICANO
Tudo o que escrevemos
Será usado contra nós
ou contra aqueles que amamos.
São estas as condições,
é pegar ou largar.
A poesia nunca teve hipótese
de se pôr fora da história.
Um verso dactilografado há vinte anos
pode ser escarrapachado a tinta na parede
para glorificar a arte como distanciamento
ou tortura daqueles que
não amamos mas também
não quisemos matar
Nós seguimos mas as nossas palavras ficam
tornam-se responsáveis
por mais do que tínhamos na intenção
e isto é privilégio verbal.
Adrienne Rich
em Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia
Tradução de Maria Ramalho e Mónica Andrade
O SONHO DE UMA LÍNGUA COMUM
Consigo ver-me há anos em Sunion,
doendo-me de um pé infectado, Filoctetes,
em forma de mulher, coxeando o longo caminho,
deitada num promontório sobre o mar escuro,
olhando pelas rochas vermelhas até onde uma espiral silenciosa
de brancura me dizia que uma onda tinha rebentado,
imaginando a força daquela água lá das alturas,
sabendo que suicídio deliberado não era comigo,
mas o tempo todo cuidando, medindo aquela ferida.
Pois bem, tudo isso acabou. A mulher que prezava
o seu sofrimento está morta. Sou a sua descendente.
Amo o tecido cicatrizado que me legou,
mas quero partir daqui contigo
combatendo a tentação de fazer da dor uma carreira.
Adrienne Rich
em Uma Paciência Selvagem
Livros Cotovia
Tradução de Maria Ramalho e Mónica Andrade
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